A Queda
Nada se movia.
Não havia som.
Não havia luz.
Mas eu senti a minha mortalidade e isso me assombrou. Afinal, como eu poderia definhar?
Sentado à beira do Abismo vi uma imensidão de gases flamejantes e aglomerados densos, ali eu senti o medo pela primeira vez. Não me orgulho disso, mas eu tentei fugir e somente as luzes me entenderam…
No fim, de nada adiantou, pois foi a bela luz daquela estrela que me prendeu, e foi a sua morte que me fez cair. Pouco a pouco, a Queda foi me cegando, e os meus olhos que uma vez já carregaram a Sombra mais negra foram clareando até que, cego, cheguei ao fundo do Abismo. Meus olhos agora eram cinza. Ouvia a gargalhada distante do Destino como uma vibração maligna em minha cabeça, senti minhas memórias se fragmentando enquanto uma forma vermelha se espalhava sobre elas.
Derrotado, me deitei no Tempo e adormeci ao vento guardando um lamento sussurrado ao Momento.
***
Gentilmente toquei seus lábios, eram macios e convidativos. Estava chovendo e as gotas escorriam pelos seus cabelos, percorriam sua face, emolduravam seus belos olhos verdes. Aqueles cabelos ondulados ardiam numa cor escarlate e contrastavam com a pele pálida.
Cometi erros para chegar aqui.
Lembro-me de ter ficado deitado naquela praia onde Caí. O céu estava escarlate, o solo arenoso era tão branco e macio e as ondas eram de um místico azul esverdeado. Minha cabeça doía e um sussurro parecia crescer entre minhas lembranças. Dor. Meu Fardo. Meu presente do Fado. Tempo sempre pareceu confuso para mim.
Desenho feito por João Luís de Lima Carvalho